RESUMO
A implantação de agroindústrias é uma das alternativas econômicas para a permanência dos agricultores familiares no meio rural e para a construção de um novo modelo de desenvolvimento sustentável, que pensa o rural como um todo e não mais apenas ligado à produção agrícola. Oportuniza a inclusão social, promovendo a participação no desenvolvimento e a eqüidade especialmente de segmentos menos privilegiados como, por exemplo, as mulheres, os idosos e os jovens.
Introdução
Segundo Brasil (2002) os agricultores Familiares representam mais de 84% dos imóveis rurais do país e estão presentes em mais de 4,1 milhões de estabelecimentos no meio rural. São também responsáveis por, aproximadamente, 40% do valor bruto da produção agropecuária, 80% das ocupações produtivas agropecuárias e parcela significativa dos alimentos que chegam a mesa dos brasileiros, a exemplo do feijão (70%); da mandioca (84%); dos suínos 58%; da bovinocultura de leite 54%; do milho 49%; e de aves e ovos 40%.
Todavia verifica-se, ao longo dos anos, uma redução na renda do agricultor familiar e outros problemas sociais, principalmente daqueles que se dedicam à produção de grãos, seus sistemas produtivos caracterizam-se por um baixo nível de diversificação, pouca integração com a produção animal, de frutas e hortaliças com reduzido grau de agregação de valor aos produtos. Uma parcela significativa destes produtores compreende meros produtores de matérias-primas para as grandes agroindústrias, ao mesmo tempo, verifica-se uma procura crescente por produtos de origem agrícola e pecuária com agregação de valor por intermédio de classificação, padronização, embalagem, processamento agroindustrial, produtos saudáveis e ecológicos e formas diferenciadas de valorização das culturas e tradições (CARVALHO, 1998).
De acordo com Silva (1998) no Brasil, historicamente, o processo de agregação de valor aos produtos agrícolas e pecuários tem sido centrado em grandes unidades agroindustriais integradoras, localizadas nos médios e grandes centros urbanos. As políticas públicas, de uma maneira geral, não têm apoiado a inserção dos agricultores familiares no processo de agroindustrialização da sua produção, apesar da melhoria das condições de vida dos agricultores familiares ser o foco de ação do governo. A inserção competitiva dos agricultores familiares no mercado é realizada por meio da redução dos custos de produção, da agroindustrialização da produção e da melhoria dos processos de comercialização, merecendo ações estruturais que objetivam a criação de oportunidade de trabalho e renda.
Agroindustrialização da Produção dos Agricultores Familiares
Compreende-se como agroindustrialização o beneficiamento e/ou transformação dos produtos provenientes de explorações agrícolas, pecuárias, pesqueiras, aqüícolas, extrativistas e florestais, abrangendo desde processos simples, como secagem, classificação, limpeza e embalagem, até processos mais complexos que incluem operações física, química ou biológica como, por exemplo, a extração de óleos, a caramelização e a fermentação. Inclui, também, o artesanato em geral no meio rural (SILVA, 1998).
Os produtos oriundos das pequenas agroindústrias, além de serem competitivos, se diferenciam dos demais pelo seu processo de produção e suas características intrínsecas. Um conjunto de características ecológicas, sociais, culturais, organolépticas, nutricionais, éticas, artesanais, entre outras que podem ser incorporadas aos alimentos e, assim, materializar a diferenciação dos produtos da pequena agroindústria, numa associação com o local de sua produção e com o saberfazer dos agricultores, conferindo-lhes sabor peculiar, apreciado por uma fatia cada vez maior da população (PREZOTTO, 2002).
Quando se avalia a participação do PIB Agrícola e do PIB do Agronegócio no PIB Nacional, são identificados indicadores de como as atividades antes e depois da porteira da propriedade agregam valor às atividades primárias. Isto pode ser observado quando analisamos o PIB agrícola, que nos últimos três anos tem tido uma participação média de 10% no PIB Nacional, enquanto o PIB do agronegócio tem uma participação média de 45% (LIMA, 2002).
As agroindústrias isoladas, que representam quantitativamente o maior segmento, se caracterizam como aquelas unidades agroindustriais individuais ou grupais que não mantém nenhum nível de relação entre si e, consequentemente, atuam de forma isolada em todas as etapas da cadeia produtiva (BRASIL, 2004).
Conforme fonte anterior, as agroindústrias articuladas em redes, que representam quantitativamente o menor segmento, podem ser caracterizadas como aquelas unidades agroindustriais individuais ou grupais que mantém algum nível de relação entre si para a solução de problemas, de estrangulamentos e de acesso à serviços, sempre com o objetivo de reduzir custos e riscos, bem como aumentar a sua eficiência e eficácia. Essas soluções podem passar desde ações simples, como a aquisição de insumos, até ações mais complexas, como estratégias de logística, marketing e comercialização.
Ressalte-se que a articulação entre as agroindústrias, resultando em formação de redes, permite a viabilização de inúmeras atividades que possibilitam torná-las mais competitivas e sustentáveis, o que é mais difícil de ser alcançada pelas agroindústrias que atuam de forma isolada. Como exemplo de ações e serviços que podem ser viabilizados por uma rede de agroindústrias podemos citar redução de custo na aquisição de insumos, na logística e no marketing; controle de qualidade integrado; administração de uma marca em comum; comercialização em comum; contabilidade e administração; legalização em relação as diversas legislações incidentes nas agroindústrias, além da troca de experiências (SILVA, 2002).
A Agroindustrialização na Bahia
Percebe-se, na Bahia, uma carência de industrialização dos produtos oriundos da agropecuária, apesar de algumas entidades públicas governamentais desenvolverem estudos e projetos na área; existem no estado pólos agroindustriais relativamente desenvolvidos a exemplo de Feira de Santana, Barreiras e Juazeiro; porém outros, apesar do potencial ou tradição no passado, estão em desvantagem. É necessário uma análise de experiências bem sucedidas inclusive de outros estados, para fornecer alternativas tecnológicas, despertando nos atores inseridos na agropecuária baiana, afim de incentivar a reprodução tais experiências na Bahia (BAHIA, 2001).
Para superar tais problemas, se faz necessário a quebra de alguns paradigmas, além de uma articulação integrada de todos os atores, percebendo o papel que cada um venha desempenhar, atuando com inteiro profissionalismo, visando o fortalecimento e sustentabilidade de toda a cadeia produtiva baiana. As atividades deverão ser estabelecidas em função das necessidades de solucionar os problemas apontados por um levantamento, a nível de Estado, junto às unidades agro-industriais, técnicos ligados ao setor, aos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural e junto aos produtores (CARVALHO, 1998).
Levantamento feito para diagnosticar a vocação e potencialidades agropecuárias em diversas localidades no estado, deverão ser desenvolvidas ações a curto, médio e longo prazo de forma conjunta entre os governos, entidades privadas e ONG´s (LIMA, 2002).
De acordo com o programa de agroindustrialização da produção de agricultores familiares, os trabalhos a serem realizados são:
Captação e Adaptação de Tecnologia: as entidades citadas serão as responsáveis em buscar soluções tecnológicas já existentes em outras Regiões, Estados e Países, testando-as e adaptando-as às condições locais.
Pesquisa tecnológica: as entidades realizarão os trabalhos de geração de novas tecnologias, dentro de um rol de prioridades indicadas pela Câmara Técnica Estadual.
Difusão de tecnologia: os resultados obtidos serão disseminados para os Executores e Especialistas para utilização juntos aos empreendedores; esse trabalho deverá ser ágil, dando efetividade à pesquisa. Uma forma importante de difusão são os Boletins Técnicos, que serão elaborados visando capacitação e orientação dos técnicos em todos os níveis.
Capacitação / Profissionalização de gestores e produtores: o público beneficiário será composto de técnicos e empreendedores que atuam no setor de agroindústria e deverá atender as áreas de tecnologia, sanitária, ambiental e de mercado.O trabalho de capacitação e profissionalização dos técnicos e empreendedores será realizado por entidades públicas de assistência técnica e ONG´s.
Acompanhamento Técnico: entidades Cadastradas para apoiar as agroindústrias e produtores nas diversas etapas do processo produtivo e na gestão do empreendimento
Considerações Finais
Os debates sobre este tema indicam a necessidade de construção de um novo modelo de desenvolvimento rural sustentável. O conceito-ação do novo modelo deve ser resultado de um processo planejado de intervenção do governo e da sociedade civil organizada, de modo a viabilizar à população rural opções duradouras de progresso, utilizando de forma equilibrada as dimensões econômica, social, ambiental, institucional, política, espacial e cultural.
Por ser uma atividade complexa, não se pode conceber que a agroindustrialização seja a solução única e imediatamente aplicável para a geração e distribuição de renda e agregação de valor à produção dos agricultores familiares. Por outro lado, a ausência de um planejamento e de apoio adequados pode frustrar os agricultores familiares, pois poderiam proliferar experiências negativas neste processo.
Como desafios, percebe-se uma falta de integração de toda a cadeia produtiva, alta perecibilidade da maioria dos produtos para o consumo in natura, além de grande vulnerabilidade de pragas e doenças, falta de incentivos para formação de parcerias entre a indústria de processamento e os produtores, alto nível de endividamento dos pequenos produtores, dificultado acesso ao crédito, treinamento precário e restrito de recursos humanos voltados para o mercado É importante o fomento à agroindústria com uso de tecnologia adequada e reestruturação de unidades existentes, para que grande parte da diversidade de produtos regionais sejam processados no estado, gerando emprego e renda, dinamizando a economia local.
Devem ser implementadas novas políticas de desenvolvimento, onde a agroindústria de agricultores familiares exerça um papel relevante na criação de novos empregos no campo, na melhoria da renda das famílias e na geração de produtos saborosos e nutritivos, em processos produtivos com padrões sanitários adequados e ambientalmente corretos.
Referências
BAHIA, Secretaria da Agricultura, Irrigação e Reforma Agrária da. Bahia Cenário de uma Agricultura, Salvador: SPA/SEAGRI, 2001.
BRASIL, Ministério do Desenvolvimento Agrário. Sabor de Brasil. Secretaria da Agricultura Familiar: Programa de Agroindustrialização da Produção de Agricultores Familiares 2003/2006 (MDA/SAF/Pronaf), Brasília, 2004.
BRASIL, Ministério do Desenvolvimento Agrário. Plano de Safra 2003/2004 para a Agricultura Familiar. Secretaria da Agricultura Familiar: Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (MDA/SAF/Pronaf), Brasília, 2002.
CARVALHO, J. L. H. de. Agricultura Cidadã A agricultura do Distrito Federal (1195/1998): Novas formas de intervenção do Estado para um novo modelo de desenvolvimento rural. Brasília: Secretaria de Agricultura, 1998. 87p.
LIMA, D. M. A. & WILKINSON, J.(org.). Inovação nas Tradições da Agricultura Familiar. Brasília: CNPQ/Paralelo 15, 2002.
PREZOTTO, L. L. Uma concepção de agroindústria rural de pequeno porte. Revista de Ciências Humanas. EDUFSC. Universidade Federal de Santa Catarina. Centro de Filosofia e Ciências Humanas. Florianópolis. N. 31, abr. 2002. p.133-154.
SILVA, J. B. & GILES, A. Pronaf Agroindústria. SDR/MA, Brasília, 1998. 48p.
¹ Administrador de Agronegócios / Diretor Geral da Mandacaru, e-mail: diretoriageral@ongmandacaru.org.br